Aplica-se o prazo prescricional de 10 anos para pretensões por inadimplemento contratual

Publicado em 09-08-2018

No recente julgamento dos Embargos de Divergência em Recurso Especial (EREsp nº 1.280.825/RJ), a 2ª Seção do STJ, por maioria, decidiu por aplicar o prazo prescricional de 10 anos, previsto no art. 205 do Código Civil, para pretensões que versem sobre responsabilidade por inadimplemento contratual.

No caso concreto analisado pela Corte Superior, a controvérsia envolvia pedido de indenização de danos pelo descumprimento do estatuto social do clube de investimentos, que resultou em prejuízos aos investidores.

Em sua decisão, a Ministra relatora Nancy Andrighi explica que não poderia prevalecer o entendimento de que o termo “reparação civil”, previsto no art. 206, §3º, V, do Código Civil poderia ser utilizado para refletir situações de danos gerados tanto por inadimplemento extracontratual como contratual.

Isso porque, segundo a Ministra, o referido termo não abrange a reparação de toda e qualquer situação, patrimonial ou extrapatrimonial, que atinja negativamente a esfera de alguém pelo descumprimento de um dever jurídico. Ele corresponde apenas àquelas consequências danosas, decorrentes de condutas ilícitas em sentido estrito, provenientes de responsabilidade civil extracontratual. Tanto é assim que, no Código Civil, não há menção à expressão “reparação civil” nas hipóteses em que se refere à inadimplemento contratual.

Para o caso de responsabilidade contratual, contudo, explicou a Ministra que há três potenciais pretensões por parte do credor, pessoa lesada pelo inadimplemento contratual, situação essa que exige do intérprete a aplicação de uma mesma regra para as três situações. É dizer, nessas três hipóteses, o credor deverá estar sujeito ao mesmo prazo prescricional para exigir do devedor a sua pretensão. Confira-se alguns trechos da decisão nesse sentido:

“Nas hipóteses de inadimplemento contratual, contudo, a regra geral é a execução específica. Assim, ao credor é permitido exigir do devedor o exato cumprimento daquilo que foi avençado. Se houver mora, além da execução específica da prestação, o credor pode pleitear eventuais perdas e danos decorrentes da inobservância do tempo ou modo contratados (arts. 389, 394 e 395 do CC/02). Na hipótese de inadimplemento definitivo (art. 475 do CC/02), o credor poderá escolher entre a execução pelo equivalente ou, observados os pressupostos necessários, a resolução da relação jurídica contratual. Em ambas alternativas, poderá requerer, ainda, o pagamento de perdas e danos eventualmente causadas pelo devedor.

Há, desse modo, três pretensões potenciais por parte do credor, quando se verifica o inadimplemento contratual, todas interligadas pelos mesmos contornos fáticos e pelos mesmos fundamentos jurídicos, sem qualquer distinção evidente no texto normativo. Tal situação exige do intérprete a aplicação das mesmas regras para as três pretensões.”

“Não parece haver sentido jurídico nem lógica a afirmação segundo a qual o credor tem um prazo para: (i) exigir o cumprimento da prestação; e (ii) outro para reclamar o pagamento das perdas e danos que lhe são devidos em razão do mesmo descumprimento. Se, em uma determinada situação que não ocorreu a prescrição, o contratante ainda pode exigir o cumprimento integral do objeto contratado (ou a execução pelo equivalente), carece de lógica negar-lhe a possibilidade de pleitear a indenização dos danos originados pelo mesmo descumprimento.”

Assim sendo, concluiu a Ministra que, em observância à coerência estabelecida no Código Civil de 2002, evitando-se, assim, antinomias, a melhor interpretação sistemática dos dispositivos normativos em discussão corresponde àquela que aplica o mesmo prazo prescricional para consequências negativas decorrentes do mesmo fato e com os mesmos fundamentos jurídicos.

Até mesmo porque, no direito privado brasileiro, explicou a Ministra que a responsabilidade extracontratual é tratada de modo distinto daquela contratual, por serem fontes de obrigações muito diferentes, com fundamentos jurídicos diversos.

Essa diferença fática e jurídica justifica, então, o tratamento distinto do prazo prescricional, assim como impede que seja aplicado o prazo prescricional de 3 anos também para as hipóteses de inadimplemento contratual.

Isso porque, reduzir a 3 anos o prazo prescricional de responsabilidade por inadimplemento contratual, sob a invocação do princípio da isonomia (art. 5º, caput, da Constituição Federal), fere “o próprio preceito que exige, de um lado, o tratamento idêntico a situações semelhantes e, de outro, o tratamento diferenciado para hipóteses que são distintas. Igualou-se inadimplemento contratual com inadimplemento absoluto, que são institutos muito distintos”, esclarece a Ministra.

Com essa decisão, o STJ aparentemente soluciona divergência surgida nos últimos anos a respeito dessa matéria, como demonstrou a Ministra em seu voto. Embora essa decisão não tenha sido proferida em sede de recurso repetitivo, incidente de resolução de demandas repetitivas e outros institutos previstos no Código de Processo Civil, é certo que, sendo mantida, o entendimento poderá futuramente ser convertido em enunciado da súmula de jurisprudência do STJ.

Diana Val de Albuquerque Silva Advogada do Resende Ribeiro & Reis Advogados [email protected]