Os impactos da pandemia da COVID-19 nos contratos administrativos
Publicado em 30-03-2020
A pandemia da Covid-19 possui expressivos impactos nos contratos administrativos, uma vez que a situação de saúde pública por ela gerada e as medidas adotadas como tentativa de sua contenção podem levar ao desequilíbrio da equação econômico-financeira do contrato administrativo.
Em linhas gerais, a intangibilidade do equilíbrio econômico-financeiro do contrato administrativo está prevista no art. 37, inc. XXI, da Constituição Federal, que garante a manutenção das condições efetivas da proposta de contrato celebrado com a administração pública.
Consoante prega a doutrina pátria, para que seja constatado o comprometimento do equilíbrio econômico-financeiro e o reconhecimento do direito à sua recomposição, devem ser identificadas (i) a ocorrência de evento superveniente extraordinário, de natureza imprevisível ou de efeitos incalculáveis; e (ii) a ampliação dos encargos e/ou a redução das vantagens inicialmente previstas quando da realização da oferta.
Todavia, o instituto de Direito Administrativo a ser invocado a fim de postular-se a recomposição do equilíbrio econômico financeiro do contrato administrativo – em especial se se trata de evento de força maior ou fato do príncipe, bem como a divisão dos encargos dele decorrentes depende de cada contrato e da lei que o regulamenta.
Isso porque, em que pese a previsão constitucional, a distribuição de riscos – dentre eles aqueles relativos a eventos de força maior ou a fato do príncipe – é regulamentada de forma distinta de acordo com a legislação aplicável a cada contrato. Por exemplo, a Lei nº 8.666/93, em seu art. 65, alínea d, garante a integral recomposição do equilíbrio econômico-financeiro ante a ocorrência de fatos imprevisíveis ou previsíveis de consequências incalculáveis, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe.
De forma distinta, o art. 5º, inc. III, da Lei nº 11.079/04, Lei de Parcerias Público-Privadas, determina que as cláusulas dos contratos de parceria público-privada deverão prever a repartição dos riscos entre as partes, inclusive aqueles referentes a caso fortuito, força maior, fato do príncipe e álea econômica extraordinária, devendo, nesses contratos, serem observadas as disposições contratuais.
Além dessas questões, a existência de apólice de seguro relativa àquele contrato administrativo que compreenda a ocorrência de evento superveniente extraordinário, de natureza imprevisível ou de efeitos incalculáveis, da mesma natureza daquele que ensejou o desequilíbrio da equação econômico-financeira do contrato, também influencia na possibilidade de recomposição da equação econômico-financeira.
Não obstante a análise de cada caso concreto, uma vez constatado o desequilíbrio da equação econômico-financeira do contrato ou vislumbrada a sua possibilidade futura, faz-se importante a adoção de algumas medidas a fim de que se possa, imediata ou futuramente postular a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato.
Em um primeiro momento, recomenda-se o estudo e reexame do edital de convocação e de seus anexos, bem como do próprio contrato, das normas expedidas pelas agências reguladoras – quando forem pertinentes ao contrato administrativo, das apólices de seguro eventualmente existentes e, por fim, das leis, medidas provisórias e atos normativos correlatos à pandemia da COVID-19.
Esse estudo e reexame das normas regentes do contrato são importantes não apenas para que seja possível obter alguma previsibilidade acerca dos efeitos da pandemia e dos atos normativos a ela relativos naquele contrato específico, mas também para que se possa identificar eventuais medidas mitigadoras a serem adotadas ou propostas, tais como a suspensão de investimentos, o pagamento parcial ou não pagamento de taxa regulatória, a prorrogação, suspensão ou compensação de valores de outorga, dentre outros.
Ademais, recomenda-se, com a máxima antecedência possível, notificar à administração pública contratante a ocorrência do evento ensejador da onerosidade excessiva, bem como as consequências esperadas e as medidas mitigadoras a serem tomadas pelo particular a fim de minimizar os efeitos daquele evento, fixando prazo para resposta quanto à anuência de eventuais medidas sugeridas pelo contratado.
Essas providências visam não apenas a constituição de condições para futuros pleitos de recomposição do equilíbrio econômico-contratual, mas também afastar eventuais penalidades de descumprimento contratual ao particular, não podendo ser-lhe imputada omissão quanto à previsão e comunicação dos riscos gerados pela pandemia, ou quanto à adoção de medidas mitigadoras da crise.
A equipe de Direito Administrativo do RRR encontra-se preparada para efetuar as análises jurídicas necessárias bem assim apoiar os clientes na tomada de decisão e das medidas delas decorrentes.
Giulia Parreira Xavier do Vale Advogada do RRR Advogados [email protected]
Tiago Souza de Resende Sócio do RRR Advogados [email protected]